18/11/2006

Home Fields

Home fields

Foi há muito, muito tempo; num cantinho escondido do recuar das recordações. Lembro-me que havia um caminho, e no horizonte o esboço de uma estação de comboios. Lembro-me que estava sozinha. E que atirava pedras para charcos parados onde a vida, onde o ritmo e o tacto da vida haviam há muito parado. Como afinal tudo o resto. E naquele dia acho que soube que parar não seria morrer, mas esperar pelo resto dos dias, sem se ter sequer ansiedade; esperar por um nada, onde nada se acomete, onde nada se sucede, em virtude da força, do peso e da saúde da idade da minha avó.
E eu ali estava. Talvez sem saber da responsabilidade implicada no sonhos. Com tantos Verões ainda pela frente, sem saber no fundo o que fazer com todos eles.
Naquelas tardes, perdíamos a reacção. Pelo menos, eu perdia. E hoje ainda, quando os sinos tocam, vejo que perdi muitos anos. E que durante todos esses anos, deixei de subir às árvores. E de conhecer outros caminhos. Deixei que, Verão após Verão, Inverno após Inverno, eu crescesse, em vez de rumar a uma terra chamada Nunca, onde nunca, por nunca mesmo!, nos obrigam a crescer. Onde nunca existem romãs demasiado verdes ou pedaços de bolo que engordam. Onde não existem sequer sonhos impossíveis. Onde só existe aquela imensidão de searas, recortadas pelo aroma de uma infância que, parecendo que não, ainda persiste. Onde tudo seria simples e saberia a cerejas. E teria o gosto de uma história. De uma história que aconteceu há muito, muito tempo. Num cantinho escondido da memória.

3 comentários:

Anónimo disse...

Amiga, tanta nostalgía acumulada, ve o horizonte, e sorri á vida para que a vida tb te sorría. A vida é maravilhosa...

Misantrofiado disse...

O teu blog está sublime!
Sempre te li... ainda me lembro da sensação primária que me invadiu aquando da descoberta das tuas palavras.
E... ainda hoje quando os sinos tocam... pois é minha inesquecida... tantos são os dias que já se nos terminaram.

(volta a ler a tua prosa... ela merece)

Anónimo disse...

Tanta nostalgia e tanta beleza juntas, numa imagem feita de recordações e de um arrependimento (?) das coisas que se imaginam não concretizadas/concretizáveis.

Bonito.