01/12/2010

Cartas de Lille IX

De repente todas as escolhas se tornaram caminhos errados. Entre uma esquerda e uma direita, eu fui nas duas direcções. Estou ainda ofegante e sei agora que o cansaço foi todo ele vão, porque no fundo nunca saí do mesmo lugar. Tenho saudades de mim própria. Saudades de ser inteira. Dizem que soltar amarras e partir sozinha me encheu de tudo, mas ninguém fala disto que em mim se rompeu e me impede de estar perto ou longe de ti.
Eu hoje só queria voltar a casa. Voltar ao calor de uma avó que nunca nos pediu nada. Voltar à pele daquele Verão em Barcelona quando chuva e sol nos abraçavam em simultâneo. Voltar àquela noite sem maquilhagem ou expectativas quando a minha vida mudou sem eu saber.
Sinto-me partida. Não consigo voltar a Portugal, mas também não consigo ficar aqui. Sinto-me sozinha. A viver de intervalos de memória onde ninguém sabia quem eu era e por isso todos me podiam amar. Hoje sou o rasto queimado e flagrante de uma mulher que desprezo e lamento. Sou uma anedota para todos os homens que nalgum lugar me tocaram o cabelo e me fingiram dar a mão. O frio que nos mata vem de dentro e não se acalma com o calor de um segundo corpo. Revejo-me em flashes que nunca tive antes e sei finalmente que só queria que me protegesses de mim própria, do meu egoísmo e desta vontade visceral de me apaixonar. Perdoar-me será então o mais difícil dos passos. Perdoar-me e deixar a tristeza e o despeito cicatrizarem. Depois, enfim, voltar a fazer as malas e continuar à procurar o meu lugar.