26/11/2006

Glasgow

Glasgow Comission

Sinto que entendes que a virtude nunca espera sozinha numa qualquer esquina do pensamento. E que com ela existem letras e letras, encafuadas em vãos de escada, onde o tempo se esqueceu de avançar; onde afinal a consumação de todas elas não foi mais do que um rabisco em papel; onde a vida, hoje e novamente, lhes parece todos os dias adiada.
Aquela imagem que vês adiante é como me imaginava ainda agora. Não sei se era eu que te dava a minha mão, se eras tu que me davas a tua. O que vejo afinal é apenas a tonalidade das cores a descair-se dos cantos; o rubor de tantas sensações com as quais me podia encaixar naquele quadro. Falo talvez com uma voz que não devia ser minha, porque sou demasiado nova. Ou talvez finja uma voz porque não consigo descortinar o timbre da minha, nem o significado das coisas que diz. Também a mim um simples sim não chegaria para te dizer que nem tudo vai bem, como já dizia a escritora. E que o temperamento das luzes que hoje se acendem é suficiente para prolongar, uma e outra vez, a persistência de tantas letras encafuadas em vãos de escada.
E existem tantas formas mais simples de dizer que gosto de ti. E tantas redundâncias que aproximam e afastam as palavras de uma realidade feita à minha escala. Deve ter sido por isso que escolhi esta imagem, ainda antes de saber sobre o que ia escrever. Porque um tema, às vezes, faz-me olhar o papel vazio como um espelho demasiado fiel a mim própria. E eu isso não quero: descobrir que apesar das tonalidades vibrantes das cores, sou transparente, e tentada a ficar vazia, da palidez da folha de papel, da textura de um rol de intenções que não conseguem sequer ser ideias.

4 comentários:

mfc disse...

Por vezes precisamos apenas de um clic (uma foto, uma música, uma palavra...) para soltarmos o que nos vai na alma.

Anónimo disse...

Há formas mais simples de dizer Gosto de ti mas nem todas estão ainda ao nosso alcance. Os olhos pequeninos, os sorrisos gigantes e as mãos a pedirem abraços são gestos tão simples que muitas vezes se perdem em pedaços de papel. Quando nem tudo vai bem mas pode ficar melhor. E porque não somos transparentes mas devíamos ser. Podemos abraçar todas as cores. Sabes, nunca iremos ficar vazios de coisas bonitas. Como este texto. Enquanto a alma reclamar atenção. E tu fores fiel a ti própria. Sempre.

Beijinhos*

A. Pinto Correia disse...

Não drei nada sobre o conteúdo. Deixa-me dizer-te que a forma como escreves atinge a excelência.
Bjs

Misantrofiado disse...

Desabafo acústico - assim senti esta tua sinceridade deslumbrante.

Eu apenas olho... mas olho.