20/05/2013

Cartas de Coimbra LIX

Tudo o que eu queria era deixar a música no play para onde quer que eu fosse. Era adiar o tempo e adiar a revolta e adiar o adeus. Seguir no compasso da música, sem sentir o deserto da almofada ou a queimadura do chuveiro ou o bafo lógico do hospital. Tudo o que eu queria era perder-me de hipnose nos solavancos de Chico ou no desgaste do Cohen. Tudo o que eu queria era não estar aqui.
 
Faltam enfim dois meses e sobrou uma Coimbra que asfixia. O povo diz de suas verdades, caprichando fitas amarelas como ritual de passagem. Eu morro-lhes de inveja. Eu não sou daqui, eu nunca fui daqui. O enlace que dei na vida dos outros desatei-o com o remoinho que foram as minhas tantas partidas e todos os meus regressos por finalizar. A devoção morreu-me na praia quando percebi que não era importante. Revi a minha vida e sentei-me à espera do momento da partida. Coimbra, sorte em não te ter para a vida, pensei. A música dizia que quem não te ama não vive e eu perdi a conta às vezes que morri por tudo o que quiseste representar. Honestidade era um caminho, mas não o teu. O teu caminho, de lirismo e socialistas e uns tantos que achavam que Coimbra era uma lição. Não rezaste as história dos teus fracos, os de espírito e os de chama. Fizeste filhos sem coragem, mas nunca me adoptaste a mim.

Faltam enfim dois meses.

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