27/01/2009

Cartas de Coimbra XXI


Eu não contava que chovesse tanto. Tenho ainda a vida inteira para sentir a chuva e por isso eu não contava que hoje, logo hoje, chovesse tanto. Vi o dia chegar pela enésima vez com o trote do comboio. Dormi à espera de acordar já na viagem de regresso. Não me custa estar aqui, custa-me apenas estar longe. Longe do ócio que é parar o relógio e deitar-me contigo para sempre. Quando te olho assim tão perto vejo a vida a fugir-me e a ideia de que tudo o que era pleno, um dia acaba. Escondo-me debaixo dos teus braços, sei que te entrelaças em mim porque me sentes partir. É melhor assim e tu sentes alívio nisso. Vemos as horas a soluçar para nós depressa demais. O nosso amor foi sempre um amor de minutos contados. Hoje foi diferente. Condensados num espaço que era impossivelmente só nosso. Palpando no escuro respostas para todas as dúvidas que recaiem sobre o depois. Perguntamos a todos os beijos onde isto nos leva, onde isto acaba, como não sofrer depois de uma manhã de chuva assim. E quando sais por fim, fica o desejo de que todas aquelas promessas se transformem em motivações, de que todas essas motivações se transformem em respostas, e de que todas essas respostas nos mantenham jovens eternamente. Quando sais por fim, fica o cansaço no corpo, os olhos brilhantes, o meu cheiro e o teu. Fica o silêncio comprometido de um segredo que detruímos os dois. E um dia, quando eu voltar, vou puder olhar-te novamente e beijar-te, sem saber o que mudou desde a última vez. Vou querer saber o que tu nunca vais querer contar. Vou querer estar na tua vida sem que tu deixes. Vou querer voltar atrás e nunca ter sentido assim.

6 comentários:

tb disse...

Gosto de te ler. Gosto do sentido e sentimento que imprimes à tua escrita. Enriquecedora de todas as personagens que crias.
Beijinhos

Anónimo disse...

Bem escrito.



Abraços d´ASSIMETRIA DO PERFEITO

Semente disse...

Há palavras que talvez sejam mais dificeis de encontrar no mar... assim juntas desta forma. Vim aqui parar com a maré. Gostei. Vou voltar*

Luís Alvarenga disse...

Foi o "nome do blog" que por razões muito pessoais me chamou a atenção. Li e gostei

Ana Monteiro disse...

Viciante.

Anónimo disse...

Como sempre.... que bom ler-te...