11/02/2007

Carnation
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És um amor invertido que eu aprendi a entender contanto os teus sorrisos pelos dedos das mãos. E que depois rejeitei como se rejeita a vida a desabrochar-se-nos no colo, como se adia a alegria dos dias a encher-se-nos todos os poros, todos os espaços livres a sobrar em nós, todas as virgulas e travessões que intercalam as palavras e os pontos finais. És um amor invertido que sabe a resignação, que me lança em voos maiores pelo gosto a paixões mais nítidas, mais ásperas e incompletas.E sabe bem estar contigo assim. Dar-te a mão desde o fundo da rua até à porta de casa, subir a continuidade das horas tropeçando contigo nos mesmos degraus. Rindo à chuva, rindo até mesmo da chuva. Abraçando com os olhos e com os lábios essa imensidão de significados que os teus silêncios e as tuas frases ininterruptas conseguem ter. Sabe bem essa tranquilidade que me ofereces ao corpo e ao espírito. Essa vontade tão súbita e intensa de metamorfose, que sinto proliferar mecanicamente sem que eu deixe de permanecer estática e calada. E enquanto estática e calada, fecho os olhos e na chuva que nos molha procuro as tuas mãos. São elas que me encontram. E quando me encontram, encontram-me, como por magia, toda de uma só vez: o corpo e a alma em simultâneo, os ombros e as pálpebras, os braços, a raiz de quem sou a querer soltar-se. Encontram-me e soletram-me na nudez do que sou. Nas travessias molhadas dos teus dedos a descobrir novos caminhos na minha pele despojada de frio.
Existirá talvez um instante futuro onde tudo estremece e finalmente acaba. Mas hoje não quero pensar nisso. Quero apenas gozar das pontas das tuas mãos a pentearem-me os cabelos e da tua voz a soprar-me quimeras ao ouvido. E peço-te apenas que não me recues à realidade que também eu conheço, que me deixes viver este pedacinho de dois durante mais umas horas para que eu possa enfim dormir feliz. Peço-te que não me escondas mais a forma estranha de seres assim, um amor invertido a sorrir-me à chuva.

4 comentários:

A. Pinto Correia disse...

Continuo fascinado pela tua capacidade de expressar sentires.
Beijo

Supremus Dies disse...

Pois eu acho que fazes muito bem em não pensar nos fins... só estarias a antecipa-los. Sim... eu sei que estás ciente disso mesmo, é obvio que sei.
;)

isabel mendes ferreira disse...

só posso repetir-me:




Beatriz




a tua escrita é belíssima.!!!!!!!!!!!





beijo.

Anónimo disse...

Não será antes um amor reflectido?

(...)

Beijinho*

Adoro ler-te! :)