17/04/2013

Cartas de Coimbra LVIII

Lembro-me do perigo dos meus repentes de choro, na mesa do almoço, quando os olhos dele me fugiam. Eu achava que era boa demais para ele. Ele achava que era tarde demais para os dois. As mãos dele avançavam nas minhas costas e arrependiam-se. Eu pagava a conta e saia. Tudo isto, sob a mesma vertingem de ir embora, sob a mesma infidelidade dormente nos ossos. Ele sabia que eu não queria mais ninguém.
Venci a vertingem e apertei-o no mesmo abraço com que o perdi. Deixei em cima da mesa todas as moedas polidas que trazia no bolso. Forcei-o a beber ao amor, ao jogo, ao tempo. Ao tempo que nós não tinhamos. Quis escrever as memórias dele por cima das minhas, e com isso salvar Coimbra, salvar o meu futuro, salvar-nos a nós. Daquele instante de cafés e cigarros, a minha história seguiu. Penso nele todos os dias, no rever das mesmas fotos.
Depois entendi a minha vida de temporária. As relações de encruzilhadas, as promessas de regressos, as histórias mal contadas. A inequívoca vontade de repetir homens que ficaram longe demais. A dormência de dormir de costas voltadas para as minhas escolhas. O mundo do outro lado do mar que cismava amor, que cismava futuro. As mesmas mãos geladas a eclodir nos mesmo vícios de sexo fingido. A preguiça de uma e de outra memória que eu nunca deixei partir. As malas desfeitas pela primeira vez em tanto, tanto tempo.

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