26/02/2011

Cartas de Lille XIII


la rue. by *moumine

Eventualmente, as expectativas mudam. Conformam-se. Seguimos o rumo patético das adolescentes tardias. Para nós sobraram amores trincados e deitados fora. Pessoas embrulhadas em papel prata que não conseguimos reciclar ou vender. Os lugares queimam-me. Cheios de uma nostalgia que finalmente se começa a desprender e a tornar-se culpa. Sabotei-me repetidamente até não fazer sequer sentido esperar seja pelo que for. Já não há lugares mágicos em Lille. Há espelhos partidos por toda a cidade onde vejo a minha imagem distorcida pelo despeito. Já não há amor ou beleza nos nossos sorrisos. Há fantasmas, habituação, vontade mesquinha de novos zeros que nos permitissem fazer de conta que nada aconteceu. Um dia, vamos voltar a ver-nos e na intensidade de tudo o que foram os últimos meses, vamos perceber a dimensão dos esqueletos que guardamos no armário. O que acontece aqui, morre aqui. Mas não morre. Não morre nunca. Cicatriza talvez e no lugar do vazio com que aqui chegamos, levamos todo este lixo emocional, repetido em todas as línguas do mundo.
Eu sei que vamos ficar bem. Como ficamos sempre depois dos rituais de passagem. Mas sei também que há perguntas que nunca deveriam ter sido ditas em voz alta. Que há lugares em nós onde nunca deveríamos ter entrado.
De repente, sinto-me uma perda de tempo e já não há ninguém que me reste por desiludir. Não fui feita para usar bata branca.

2 comentários:

Maria Mi disse...

desde sempre que te sigo e que trago um bocadinho de ti dentro de mim*

Misantrofiado disse...

...e já não há papel que nos embrulhe convenientemente, muito menos esse, de prata, que quando amarrotado, evidencia com uma facilidade cínica, todas as nossas escarpas.




Há lugares em nós que nada a si reclamam.