02/03/2009

Cartas de Coimbra XXII





É tudo uma questão de tempo. Desde o dia em que nasceste, desde aquele fatídico primeiro dia do resto da tua vida, desde o novo recomeço que compraste no virar da estação. Há filmes* que não falam de outra coisa se não de ti próprio. A tua vida no grande ecrãn, a mesma paixão com que jogaste os dados e te esqueceste de arriscar. Perdoa-me se minto, mas vivo de ti como uma árvore de seiva; a virtude de criar raízes bem longe de mim própria; a fidelidade com que te trago comigo em tudo o que de fantástico me acontece. As coisas bonitas, as crianças pequenas, os casais de namorados, o Mondego pintado a lapiz de cera. Sinto Coimbra com a preplexidade de um último adeus e é para ti que construo todas as minhas melhores lembranças. Sei que um dia vou voltar de muito longe e vou procurar-te , vou deitar-me contigo e amar-te pela primeira vez novamente. Vou ousar irresponsavelmente dizer-te que terei meninos não parecidos, mas iguais a ti. Vou falar horas e horas a fio, como se te lesse o futuro no branco dos olhos e te prometesse que a terra, o vento e o mar um dia me hão de caber na palma das mãos.
É tudo uma questão de tempo, repito. Eu não sei dizer de outra forma, o tempo e o espaço têm cheiro e cor e normalmente nome. O meu nome é o teu. A criação invertida de um punhado de anos que serão sempre sobre ti. E em dias assim, eu paro e tento sentir-te como uma memória, o dedilhar dos teus dedos nas minhas costas, o crescer da tua voz soprada ao meu ouvido. O infinito que encontrávamos no sabor das coisas, nos beijos lentos que não tinham tempo, e eram felizes assim.












*The curious case of Benjamin Bunton

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