01/03/2014

Cartas de Évora III



Os fins como te lembras deles. A necessidade de queimares tudo à tua volta e encheres a tua vida com a cinza do que já não és. Foi sempre assim. O frio, a velocidade dos dias, os nomes que esqueceste. Estás a correr em direcção à neutralidade de um passado que nunca enterraste - precisas de ar, precisas de tempo. A música de outros dias dissolvida na angústia de todas as paragens de comboio que viveste. Falta-te o metal, as travagens, os estranhos sentados à janela. Falta-te a guitarra dele - o melhor dos inícios da tua vida. Já morreste de felicidade sem perceberes. Era amor, ou tanto faz. Eras tu a favor do mundo, sem decisões, sem espaço para remorsos. Eras tu, apaixonada sem risco, adiando crenças, relativizando a leveza com que as melhores pessoas entraram na tua vida. Queres, mais que tudo, voltar atrás. Reviver. A liberdade das noites cheias de neve, os passeios vazios de gente, a confiança dos teus passos. 

1 comentário:

Carlos Soares disse...

as tuas cartas são lindíssimas.