09/03/2010

Cartas de Coimbra XLI

by ~firar

Querido Luís,
Estas cartas são tuas. Escrevi-as talvez desde sempre. O papel de rascunho, o balançar do comboio, o timbre único da voz do Doherty. Está tudo nestas cartas. A minha vida inteira, virada do avesso, rasurada como se as palavras francas não soubessem que são poesia.
São cartas de amor, mas principalmente cartas para te revelar o que existe diante e por detrás dos meus olhos. Sempre te disse que vejo demais. Mas nunca te disse que o que vejo normalmente são coisas irrepetíveis e por isso tudo nestas cartas são também segredos. Abrir mão e falar-te deles é para mim a mais difícil prova de confiança.
O que aprendi contigo nunca mais poderei repetir. Sabemos, simplesmente sabemos, que estes foram os nossos melhores anos. E deles ficarão os cheiros, os sabores, a pele arrepiada e fria, as viagens de ida e as viagens de volta. Ficará também o medo de cair, o medo de, todas as semanas e todos os dias, partir para longe de ti e de, com isso, partir para longe do meu último lugar seguro. Ir embora será sempre motivo de luta interior, um estado permanente de guerra comigo, contigo e com o mundo. Mas amar-te precisará talvez sempre disto, desta forma calada de dizer-te por sinais de fogo quais as batalhas que escolhi e quantas ganhei. Nunca, em momento algum, tentei magoar-te. Seria atacar a mais vibrante das convicções que trago comigo. E nestas cartas dou-te o reflexo de tudo o que tenho de mim própria, os limites e as razões de todas as angústias, de todos os receios, de todas as promessas, de todas as histórias que fizeram sentido, porque te amava, de olhos mais ou menos fechados.

1 comentário:

Ana Sofia Cavadas disse...

Olá Beatriz!

Já há muito tempo que não te dizia isto, "olá". Não porque não tenha cá vindo nos últimos tempos. Muito pelo contrário, eu venho espreitar este teu cantinho muitas vezes. E o que me apraz dizer agora é que cresceste, crescemos.
Este post deu-me vontade de deixar um comentário por causa dessa luta interna de que falas: "Ir embora será sempre motivo de luta interior, um estado permanente de guerra comigo, contigo e com o mundo. Mas amar-te precisará talvez sempre disto...". Li-me nestas palavras, porque penso que também nunca irei deixar de estar numa luta permanente com o mundo e, sobretudo, comigo mesma. E não penses que lamento esse facto. Pelo contrário, acredito que é lutar que nos mantém não só vivos, mas também despertos.

Um beijo,

Ana Sofia Cavadas.