19/01/2012

Cartas de Coimbra LII

Quando o amor morreu, eu achei que morriam contigo todas as memórias. A raiva, a falta de confiança, o medo, a eterna sensação de que era a tua última escolha. Seguir em frente provou-te que eu estava melhor sem ti. Que eu fui o melhor que te aconteceu, conformada com todas as asneiras que te deixei fazer no passar dos anos. O dizeres-me, no conforto de me veres sem saídas, que procuravas todos os dias por outras mulheres. Que não, não tinhas tempo para um último serão, porque os teus amigos esperavam por ti. As vésperas das minhas viagens, quando tinhas tempo para o mundo inteiro menos para mim. A minha vida que não valia nada perto da tua: um eterno desempregado à espera que um cometa passasse. Os teus dias que se somavam e tu não tinhas nada para me dizer. Esse eterno desprezo de quem se contentou com o que mais ninguém queria. Essas semanas que se passavam sem um telefonema teu. Essa falta de caracter que, olhando para trás, esqueceste. Não concebo pior filho da puta que tu.

Quando o amor morreu, eu achava que podia seguir com a minha vida. Que homem algum, alguma vez me faria passar por tudo isso outra vez. Mas depois aconteceu e todos os dias te odeio um bocadinho mais. Encontrei a minha vida cheia de estilhaços do que um dia deixei que fosses, com o medo de te encontrar em todos os homens que viesse a amar, com o medo de que outros iguais me vergassem perante a evidência de que não mereço, porventura, muito mais. Olho para trás e detesto-me por todos os domingos à tarde que perdi contigo. Pelo nada que eras e que em nada me convertias. Pelas frases ligeiras que só a tua profunda maldade permitia. "Ao fim do meu dia, nem por um momento me lembrei de ti".

Lamento raivosamente tudo isto. A total ausência de compromisso. A inércia. Os melhores amigos que nunca quiseram saber de ti mas que me batiam em prioridades. Aquela maldita tarde em Sintra. Aquele maldito filme no cinema que não querias ver. Aqueles tristes aniversários de namoro. Aquela estúpida necessidade de competires com a minha felicidade em vez de fazeres parte dela. Aquela eterna dúvida de quantas vezes te enganei sem que tu te importasses.